sexta-feira, 28 de outubro de 2011

MARTIN HEIDEGGER: O confronto Sistemático-Crítico com a história da filosofia.( The systematic and critical confrontation with history of philosophy)

filosofo martin heidegger

Título: MARTIN HEIDEGGER: O confronto Sistemático-Crítico com a história da filosofia.

Autor: FABIO GOULART

PORTO ALEGRE, 2010.
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ABSTRACT
Proposing a method capable of overcoming the dualism common in the history of philosophy between subject and object, Heidegger stands in a position critical-systematic comparison with the history of philosophy. His central idea is that the veiling and unveiling of being would not be just at the thought of each thinker, but in the entire history of philosophy. So he ends up sinking into a tremendous "problem of language." A true "walking a tightrope" between the analytical and the philosophy that makes dialysis complicated and incomplete.
             Keywords: Dasein, Question of Being, History of philosophy.

RESUMO
Propondo um método capaz de superar a o dualismo comum na história da filosofia entre sujeito e objeto , Heidegger se coloca em uma posição de confronto sistemático-crítico com a história da filosofia. Sua ideia central é a de que o velamento e desvelamento do ser não estaria apenas no pensamento de cada pensador, mas sim em toda história da filosofia. Para isso ele acaba se afundando em um tremendo “problema de linguagem”. Um verdadeiro “andar na corda bamba” entre o analítico e o dialítico que torna sua filosofia complicada e incompleta.
Palavras Chaves: Dasein, Questão do Ser, História da filosofia.

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                Quando escolhi o curso de filosofia e consequentemente a carreira de filósofo como objetivo de vida, não fiz isso com a intenção de me tornar um grade filósofo ou de calar as perguntas mais existenciais da minha mente. Fiz esta escolha devido a minha crença particular de que somente através da filosofia é possível existir valor e significância para as coisas e para a vida.
                Dentre todas as dúvidas habitantes em minha cabeça apenas uma era existencialmente importante a ponto de “ter que ser necessariamente respondida” pela filosofia: “Por que existe algo ao invés de nada?
                Ao tentar expressar e compreender o Dasein Heidegger é, sem dúvida, o filósofo que mais se aproxima de minha crise existencial. Propondo um método capaz de superar a o dualismo comum na história da filosofia entre sujeito e objeto , ele se coloca em uma posição de confronto sistemático-crítico com a história da filosofia. Em palavras mais simples: A história da filosofia precisava ser repensada através do método heideggeriano para que seu método tivesse sentido e desvelasse suas questões.
                A ideia central do método heideggeriano é a de velamento e desvelamento oriunda do termo grego aléteia, que significa exatamente velamento e desvelamento. Ela parece ser extremamente simples, mas é o “carro chefe” do movimento de totalização buscado por Heidegger.
                Este método permite captar em um único movimento o processo do pensamento, derrubando o dualismo “método-objeto”. Isso o levaria a uma visão mais transparente da história da filosofia e suas questões.
                Por outro lado, A tradição filosófica nos traz dois modelos explicar a história da filosofia:
                1° O Lógico-analítico que é sistemático, crítico e está ligado à problemas da linguagem;
                2° O Especulativo-dialético baseado no sistema tese, antítese e síntese.
                O método analítico além de não estrar preocupado com “a questão mesma” mas sim com o sistema de predicadores que determina a lógica a lógica do texto, não atinge a totalidade desejada por Heidegger. Diríamos que não apenas o método permanece exterior a coisa, mas é exatamente por causa do método  que a própria relação da linguagem com a coisa é exterior.
                Diferentemente disso, o modelo especulativo-dialético é totalizador. Vê a história da filosofia como um todo onde cada filósofo se move e está ligado à “questão mesma” de cada texto. Diríamos que para Heidegger dialogar significa “penetrar na força e no âmbito do que foi dito pelos primeiros filósofos”. Para ele a procura não está no que foi dito, mas em algo impensado. Por fim, caso se adote uma linguagem muito especulativa, o modelo dialético de método pode se tornar complexo e obscuro.
                Com isso Heidegger descobre uma radicalização progressiva do esquecimento do ser na história da filosofia. Faz-se necessário buscarmos um caminho que revele o jogo de luz e sombras da questão do ser.
                Para isso o filósofo não procura a história da filosofia para ampliar um sistema filosófico particular. Ele á procura de maneira sistemática, crescendo organicamente dentro da tensão que sua visão totalizadora gera na história do pensamento.
                A grande novidade de Heidegger foi mostrar que a estrutura polar “velamento-desvelamento” não está apenas no pensamento de cada pensador, mas sim em toda história da metafísica ocidental.
                O problema que surge é que ele também faz parte destas história, não podendo expor seu pensamento como se não fizesse. Assim sua obra mergulha em uma constante tensão entre o que está sendo dito e a maneira de como é dito.
                Por isso ele busca uma linguagem especulativa e que “ao ser especulativa” não deixe de ser suficientemente crítica e autocrítica. Busca o controle da linguagem sem cair numa relação puramente exterior as questões fundamentais do texto.
                Mas como fundir a linguagem com a questão fundamental do texto sem perder o controle da linguagem?
                Parece que ele não conseguiu responder e deixou esta questão em aberto.
                Em sua obras Heidegger constrói uma linguagem própria, uma verdadeira “teia de conceitos”, pois cada uma de suas palavras só tem o sentido desejado quando amarrada as demais.  Ele abusa dos recursos que a etimologia oferece para gerar tenção nas palavras; e para isso empurrá-las cada vez mais na direção da estrutura ambígua de velamento e desvelamento desejada.   
                Julgo que ao buscar um sistema totalizador especulativo e crítico onde a questão do ser se vela e desvela na história da filosofia, ele acaba se afundando em um tremendo “problema de linguagem”... Um verdadeiro “andar na corda bamba” entre o analítico e o dialético, onde a linguagem é um fardo pesado tentando derrubar o filósofo a qualquer momento. Por fim, o resultado é uma filosofia desnecessariamente complicada de ser entendida e incompleta no sentido de que não respondeu muitas de suas questões fundamentais acerca do ser.
andando na corda bamba lua

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Obs.: Trabalho feito a partir das aulas do professor Dr. Ernildo Stein. Um dos maiores nomes quando o assunto é Martin Heidegger.  

Mistério capitalista ( Mystery capitalist )

pra copa tem dinheiro e pro povo não
"To World Cup have several billion dollars, but for schools and public hospitals do not have anything?!?"

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

ENSAIO SOBRE O DIVINO NO MUNDO VIRTUAL (ESSAY ON THE DIVINE IN THE VIRTUAL WORLD)


Título: ENSAIO SOBRE O DIVINO NO MUNDO VIRTUAL


Autor: FABIO GOULART

PORTO ALEGRE, 2011.
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ABSTRACT

I was surfing the internet and trying to recognize in myself that while I was sailing.There I met, I found a different me. In this work I decided to wander over that other and I like that I relate to the divine. Were a test, my only intention is to explore these ideasin my head scrambled in light of studies in philosophy of religion.

             Keywords: God, Internet, Virtual world.

RESUMO

Estava eu navegando na internet e tentando me reconhecer como eu mesmo enquanto eu era aquele que navegava. Não me encontrei, encontrei um eu diferente. Neste trabalho resolvi devanear sobre esse outro eu e como esse eu se relaciona com o divino. Tratasse de um ensaio, minha única pretensão é de explorar essas ideias embaralhadas na minha cabeça na luz dos estudos de filosofia da religião.  

Palavras Chaves: Deus, Internet, Mundo virtual. 

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1. A Suposta Necessidade de Uma Filosofia Virtual


De fato cada vez mais pessoas utilizam a internet, como também é fato que cada vez as pessoas utilizam mais a internet. Não é nenhum exagero dizer que a internet definitivamente faz parte de nossas vidas e que muitos de nós não viveriam sem ela. Com isso não estou apenas me referindo a suas funcionalidades e praticidades no dia-a-dia. Quase todas as empresas de médio e grande porte atuais utilizam a internet para se comunicar, armazenar e trocar informações internas e externas, afinal a internet traz velocidade e segurança para isso. Se de uma hora pra outra deixasse de existir, ou se ela nunca tivesse existido, certamente as perdas seriam gigantes, mas muitas destas empresas continuariam existindo, apenas teriam que encontrar novas formas de fazer o que é feito on-line no mundo em que vivemos.
O “problema da internet” começa a ganhar dimensão interessante quando levamos em conta que milhões de empresas hoje só existem devido à internet. Esta rede mundial de computadores permitiu a criação de diversos novos paradigmas comerciais e hoje é fato que não somente mais de 20% da população mundial está conectada a internet, como também um numero ainda maior só consegue por o alimento na mesa de sua casa devido a existência da mesma. Talvez eu esteja exagerando nesta última frase, mas o fato é que o mundo só é com é hoje devido à existência da internet, se ela não existisse o mundo evidentemente seria muito diferente do que conhecemos. Julgo que desde a metade dos anos 1990 começamos a viver a era de internet.
Com isso estou me atrevendo dizer que nossa vida material já é refém de nossa vida virtual. Se desde a Grécia antiga os filósofos como Platão e Aristóteles tentavam entender o suposto dualismo do homem dividido entre material e imaterial, entre corpo e alma, entre forma e matéria. Julgo que é chagada a hora de se filosofar sobre o dualismo do homem material e o homem virtual. Não há conciliação neste ponto, somente diálogo, o eu material termina onde o eu virtual começa, as relações humanas seus sentidos e significados estão afetados para sempre. Meu eu virtual habita o mundo virtual. Ao contrario da minha mente ou de uma suposta alma, meu eu virtual não tem nenhuma relação com meu corpo feito de carne que um dia apodrecerá e será comida para as larvas. O corpo material do meu eu virtual são os vários servidores espalhados pelo mundo, ele é imortal enquanto houver backups, habita um tempo e espaço diferentes dos nossos.
Fig. 1: Nesta figura vemos um esquema que revela uma fração da internet, suas estruturas e conexões. A sensação é a mesma de quando olhamos um esquema feito pela NASA para mostrar uma fração do universo material e suas galáxias.

Ao usar este conceito de “eu virtual” estou dizendo que são necessárias novas noções de antropologia filosófica, pois o ser humano e suas relações precisam também ser pensados dentro da dimensão virtual. Mas não para por ai, a velha metafísica precisa também ser re-pensada, velhos conceitos como forma, conteúdo, substância, sujeito, objeto tem um novo sentido neste universo que é em si e por si evidentemente metafísico, afinal os códigos binários (1010001100110) que estão por trás de sua existência são evidentemente metafísicos (no sentido de não serem físicos ou materiais). Parece-me que a lógica e epistemologia também precisam evoluir neste universo e julgo que aqui encontraram recursos que permitiram a resolução de diversos problemas crucias, afinal toda linguagem de programação que permite a existência metafísica do virtual é puramente lógica. Nem mesmo a moral e a ética escapam do virtual a partir do momento que é possível que as pessoas materiais interajam, se organizem, gerem atividades sociais que só são possíveis através do universo virtual graças as suas redes sociais, como Facebook, MySpace, Orkut, Twitter, etc; está se criando também uma nova forma de socialização e interação, surge a necessidade de pensarmos em novas condutas éticas e julgamentos morais. Estamos vendo o povo se “se armar” no universo virtual e derrubar velhos monarcas e ditadores da realidade carnal, a política também está se reestruturando.


Fig.2: 04 de Abril de 2011. O Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama aperta a mão do jovem criador e CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, na sede da rede social em Palo Alto (EUA). No mesmo dia os conflitos no mundo árabe que se organizam a partir das redes sociais se intensificavam.


Estou exagerando ao falar em “eu virtual”? Tudo que eu escrevi poderia ser usado apenas para mostrar que a internet é uma bela ferramenta para o uso em nossas vidas, mas não que existe um “eu virtual”. De fato estou exagerando, mas acredito que é somente a partir da percepção do absurdo é que aquilo que era óbvio, mas estava oculto, começa a se revelar.
Mesmo o dinheiro, um velho símbolo do poder materialista, se virtualizou. Não tenho mais dinheiro tenho um cartão de débito, quando tiro meu extrato e está descrito lá “R$1000,00”, estes dígitos não se referem a uma caixinha cheia de notinhas escrita meu nome, estes números referem ao meu virtual poder aquisitivo. Se todos fossem ao mesmo tempo ao seu respectivo banco sacar seu saldo, adivinhem o que iria acontecer... não haveria a correspondência real de todo esse dinheiro, o sistema monetário mundial entraria em falência instantânea, isso pois dinheiro é só um pedaço de papel ou metal, seu valor está todo em seu virtual poder aquisitivo.
Por fim necessitamos filosofar acerca do eu virtual porque o ser humano está evoluindo nesta dimensão muito mais do que nas outras (entendo como outras: animal, racional e espiritual). Se não atentarmos para esta dimensão com a devida atenção, é provável que ela se erga falicamente em nossas vidas e engulas as demais. Se isso acontecer o eu virtual, que neste momento ainda pode ser encarado como uma mera representação do eu racional e animal, irá aos poucos se tornar o “eu real”(aquele “eu” que é majoritário em nossas vidas) e nossa vida material se tornará mera ferramenta utilizada para atender as vontades do eu virtual.

2. As instituições e o Virtual
           
            O ser humano está se virtualizando, o eu virtual está tomando forma é poder, as nossas relações são cada vez mais virtuais. Sabendo disso, fica evidente que as instituições também estão se tornando virtuais.
Basicamente junto com a popularização da internet no final dos anos 1990 surgiram os primeiros e-commerce, no geral eram ferramentas de grandes lojas existentes no mundo material que viam na internet um grande mercado em potencial. Quase todas as grandes empresas que entraram na internet, estão lá até hoje, o que nos interessa é que em pouco tempo muitas pequenas e médias empresas que não teriam a menor chance de competir contra gigantes reais começaram a crescer espantosamente no mundo virtual. Já há algum tempo, existem diversas empresas que são 100% digitais, não existe no mundo físico, são apenas pequenas unidades especificas que coordenam centros de distribuição ou ainda, que fazem a mediação de negócios entre seus usuários. Basta entrar no http://www.mercadolivre.com.br/ que você entenderá a que nível de vitualização já podemos chegar no comércio de mercadorias. De encontro com o que foi dito antes, milhões de pessoas dependem direta ou indiretamente da internet para viver, observem o aumento do número de motoboys em nossas cidades e pensem naquilo que eles fazem com seus salários, pensem na compra das motos, na gasolina, nas roupas, etc... independente daquilo que você atualmente faz, é basicamente certo que tem ligação com internet e que em algum momento do processo que mantém aquilo que você “é” existe a virtualização no processo.
            As escolas e as universidades estão se virtualizando. Hoje é muito difícil encontrarmos alguma instituição de ensino superior no Brasil que não tenha alguma espécie de “ambiente virtual” no estilo Moodle. Estava conversando recentemente com o professor Erico João Hammes da faculdade de teologia da PUCRS e chegamos a conclusão que essa virtualização do processo de educação é uma conseqüência lógica da virtualização do ser e das relações humanas. Julgamos que por mais que possa parecer contrários aos padrões atualmente aceitos como bons para uma educação de qualidade, cada vez mais as pessoas tem menos tempo para se relacionarem fisicamente, então a relação virtual começa a ser mais interessante, pois o nosso tempo é melhor administrado quando estamos agindo através de nosso eu virtual. Com isso é provável que aquele que “aprende à distância” aprenda com mais autonomia, e se não com mais qualidade, pelo menos com mais prazer e melhor aproveitamento de seu concorrido tempo.
            Mesmo a família já não é mais a mesma. Ela tende cada vez mais a se virtualizar. Namoros e casamentos começam e terminam na internet, quem utiliza as redes sociais como Twitter, Orkut e Facebook sabe bem o que estou falando[1]. O pai que quer conhecer verdadeiramente um filho precisa esta on-line em todas as redes de sua criança, caso contrário não saberá nada de sua vida, as crianças de hoje em dia são muito mais ativas no ambiente virtual do que no mundo material, isso porque lá quebram mais facilmente barreiras como a timidez e o preconceito contra sua jovem idade. Já existem famílias onde cada um tem o seu PC e costumam a se relacionar muito mais enquanto seres virtuais do que como seres materiais. Não julgo que isso seja ruim, apenas diferente. Falta o calor humano? Quando o outro está do outro lado da sala, sim, falta calor, mas quando o outro está do outro lado do mundo a relação é muito mais próxima do que quando não havia a virtualização.
            Em suma, a tendência é que nos próximos anos todas as instituições começarão a dar mais ênfase a sua existência virtual do que em sua existência material, isso porque o próprio ser humano fará isso consigo. Quando? Não posso afirmar, mas o fato é que cada vez mais estou mais disponível on-line do que pessoalmente.  

3.As Igrejas e o Virtual

            Como ficam as igrejas nesse processo? Não sei, mas posso observar o que está acontecendo agora...
            “Que tal um site de orações que está em comunhão com Deus?” http://www.bahai.org.br/oracao/
            “Faça seu pedido de oração, e uma equipe de intercessores em todo o Brasil e exterior estará constantemente orando por todos pedidos de oração feitos através desta página.” http://www.jesusvoltara.com.br/pedidos.htm
            “Pra quê ficar perdido, converse com um pastor on-line”http://www.teologia.org.br/pastor.htm
            “Congregue nas redes sócias! Comunidades no Orkut oferecem serviço de oração 24 horas online e reúnem testemunhos” http://www.orkut.etc.br/portal/oracao_orkut
            Até ai tudo bem, se as pessoas estão se relacionado cada vez mais entre elas através do ambiente virtual, não poderíamos pensar que elas também não passariam “a olhar para os céus” através da tela de seus computadores e dispositivos móveis. Não é mais necessário guardar o sábado ou o domingo para o Senhor, seria tolice, afinal esses são os dias de maior movimento, precisamos ganhar dinheiro. Posso assistir ao programa religioso de quase todas as religiões de segunda a sexta na televisão e caso não tenha tempo, acesso a internet e corro atrás do último culto. Certa vez um amigo me disse “não ter tempo não é mais uma desculpa para não nos mantermos juntos de Deus e de nossos irmãos”.
                                           Fig.3.: Igreja Show da Fé, um sucesso da TV brasileira.

            O problema que a religião e as igrejas terão impreterivelmente de resolver dentro desta nova perspectiva virtualizada é aquilo que chamo de “fenômeno pós ou neo religioso”. Existem muitas informações de cunho religioso na internet, aquele que nunca recebeu e repassou alguma corrente milagrosa no seu e-mail que atire a primeira pedra. Evidente que tais informações foram postadas pelos mais diversos tipos de pessoas com as mais variadas intenções. Todo mundo pode postar e comentar quaisquer coisas sobre qualquer coisa no ambiente on-line. Aquilo que foi postado pode tomar tal dimensão que antes que podermos imaginar: se torna “religioso”. Juntando tudo isso, na internet cada individuo pode se focar naquilo que lhe interessa, pode fazer uma grande “colcha de retalhos” com os fragmentos religiosos dos outros e o resultado prático são seitas estranhas ou atos absurdos como o caso Wellington Menezes, afinal toda religião carrega consigo uma série de pressupostos que dão fundamentos existenciais para os atos de seus adeptos, não é necessário fazer uma longa digressão para nos darmos conta do tamanho da espécie de “poder” que um indivíduo pode pensar ter no momento que configura sua própria religião através da consciência oriunda de seu eu virtual.
Fig.4.: Com base em fragmentos de varias religiões Wellington Menezes planejou seu ato e entrou armado em uma escola assassinando diversas crianças em nome de sua vingança. Em suma ele criou uma fundamentação religiosa que não somente permitiu tal ato deliberado, como também dentro de sua crença pós\neo religiosa: “ele fez o era certo”.

4.O Divino e o Virtual

            Desde já antecipo: O eu virtual é o indivíduo elevado ao seu nível máximo.
            O homem está lá, as instituições estão lá, as igrejas estão lá... E Deus? Há lugar para o divino no ambiente virtual?
            Epicuro, na longínqua Grécia antiga, era um materialista convicto, mas não era ateu. Devido a isso ele se viu num problema de ordem teológica: como seria possível a existência de seres superiores e divinos num universo composto por um número finito de pequenos átomos? A solução encontrada pelo mestre dos jardins para este problema foi ingenuamente simples, Deus estaria num espaço entre os diversos universos existentes. Espalhando seus átomos para tudo aquilo que existe, mas também recebendo os átomos de todo aquilo que existe. Assim sendo, Deus permanece eterno e feliz, mantedor das sabedorias universais, porém sem se envolver com nada que ocorrem nos universos, afinal ele não está em nenhuma das dimensões[1].
            Tal como o filósofo da alegria eu me atrevo a dizer: Deus não está na internet, Ele não poderá ser encontrado no meio dos bits e bytes que abastecem a existência virtual. Neste universo ele não é e não pode ser o criador ou o ordenador. Deus não se faz presente nessa realidade. O Deus virtual não existe.
            Para Nietzsche Deus é invenção da debilidade humana e a negação de sua existência seria a superação do próprio ser humano. O que teria dito ele se pudesse desfrutar de um universo no qual Deus não faz parte e onde o individuo pode navegar livremente fazendo valer seus desejos mais bizarros como “ser outra pessoa”?
            Enquanto eu virtual o homem é livre, pois para este eu, Deus está morto, é como se Ele nunca tivesse existido. Mas o que dizer o que dizer das leis e regras de conduta que limitam os atos on-line? E sobre a religiosidade digital citada no capitulo anterior? Gostaria de fazer algumas considerações a respeito.      
            Tal como para Nietzsche a religião é a autodilapidação institucionalizada do homem (ZILLES, p.166), julgo que tais movimentos religiosos no ambiente virtual também o são. Só há uma coisa mais ridícula do que receber uma corrente ameaçadora no e-mail... é repassar esta corrente para um número “X” de pessoas com medo que alguma maldição divina possa recair sobre sua cabeça. Diria eu que todo e qualquer tipo de verdade passa longe destas manifestações pós \ neo religiosas presentes no ambiente virtual. Tentar trazer as religiões para o ambiente virtual é como tentar vestir uma velha senhora de oitenta anos com as roupas justas e sensuais de uma moça de dezessete anos. Neste sentido, uma reforma racional teológica seria muito mais interessante do que um Twitter do Papa[2].
            A tentativa de trazer o sagrado para o virtual se apóia no ressentimento de pessoas fracas que quando se encontram desamparadas num ambiente livre de pressões divinas, sem saber o que fazer, negam essa realidade e trazem a sombra de Deus para dentro do ambiente virtual. Esta sombra oculta a possibilidade de verdade, oprime os fortes e falsamente ampara os fracos, pois os torna ainda mais fracos e sem liberdade.       
Deveríamos aproveitar o ambiente virtual para nos movimentar livremente e desenvolver coisas que somente com essa liberdade podemos fazer. Estar livre das opressões divinas no ambiente virtual não deve ser encarado como algo preocupante, pelo contrário, deve ser encaro como uma vitória. Criamos nosso próprio mundo e devemos nos virar em desenvolve-lo do nosso jeito, pois se Deus não tem acesso a internet, os valores morais oriundos da divindade também não se aplicam lá. Quando falamos em moral e ética no ambiente virtual, precisamos pensar em uma nova moral, algo totalmente específico. Visto que Deus não vive lá, tudo precisa ser reavaliado. Mas ainda temos muito caminho até lá, pois os homens ainda não se deram conta desse fato.
Mas Deus não pode estar cego frente as coisas que ocorrem na internet, pois ele é onipotente, onipresente, criou o céus a terra e tudo mais! Tal com para Epicuro Deus está em outra dimensão trocando átomos com universos no qual não possui nenhuma relação, o mesmo deve ocorrer quanto ralação entre o divino e o virtual. O eu virtual é o indivíduo elevado ao seu nível máximo, isso significa dizer que através dele podemos simular a experiência de sermos o super-homem de Nietsche num universo livre da opressão divina. Enquanto os simples homens ficarem por ia, navegando na internet sem perceberem isso, o @Zaratustra está postando como um louco em seu Twitter, Orkut e Facebook: “Procuro Deus! Procuro Deus! Ter-se-á se perdido como uma criança?(...) Pra onde foi Deus?” (ZILLES, p.166).
                                         Fig.5.: Deus navegando na internet.



Conclusão

É chegada a hora de darmos mais atenção filosófica ao fenômeno da internet, pois a vida de muitos e a existência de todos parecem estarem envolvidas com isso. Ficamos tanto tempo on-line que nossas vidas e sociedades estão aos poucos se virtualizando. Surge então o eu virtual, o individuo elevado ao seu grau máximo. Em suma esse eu virtual é a simulação do super-homem de Nietzsche vivendo em universo livre da opressão divina. Algo que não tem nada de glorioso, pelo contrário, é tão enganador e decadente quanto Nietzsche julgava ser a vida religiosa. Talvez essa seja justamente a decadência do ser humano no Séc. XXI, algo que os filósofos terão que discutir.
            Ainda pretendo me aprofundar nos problemas aqui propostos, mas estou sem tempo... Tenho que enviar alguns e-mails, atualizar meu blog, postar no Twitter e conferir meus orkuts e facebooks.

Referências

ULLMAN, Reinholdo Aloysio. Epicuro: O filosofo da alegria. 3 ed. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2006


ZILLES, Urbano. Filosofia da religião. 5 ed. São Paulo: Paulus, 2004





http://wn.com/Show_da_F%C3%A9 acessado em 31/05/2011.







[1] Minha livre interpretação bem resumida deste fantástico filósofo.
[2] Dou como exemplo aqui a igreja católica, mas o mesmo vale para outras religiões que em pleno séc. XXI ainda tentam aumentar seu poder e marketing share através de ocultismos irracionais. 

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Viver Bem ou Viver Moral? (Living Well or Living Moral?)

capitalism isn't working misterio capitalista

Título: Viver Bem ou Viver Moral?

Autor: FABIO GOULART

PORTO ALEGRE, 2011-2013
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ABSTRACT

In this paper I focused the analysis and linear text author Thomas Nagel (book: theview from nowhere, Chapter: Living Well and Living Morals), I chose not to seekexternal authors, concentrating on extracting the central meaning of what was beingargued. Based on this, which analyzed the proposal of the author to the tension between our individual wills and an objective which will be the bases of most moral theories and ethical. In simpler words: To what extent my particular desires come into conflict with the ethical impersonal?

                     Keywords: Live well, live morally, ethics.

RESUMO

Neste trabalho me concentrei a uma análise bem linear do texto do autor Thomas Nagel (livro: Visão a partir de lugar nenhum, capítulo: Viver Bem e Viver Moral), preferi não buscar autores externos, me concentrando em extrair o sentido central do que estava sendo argumentado. Com base nisso, analisei qual a proposta do autor para a tensão existente entre nossas vontades particulares e uma vontade objetiva onde se fundamentam as bases da maioria das teorias morais e éticas. Em palavras mais simples: Até que ponto meus desejos particulares entram em confronto com os fundamentos éticos impessoais?

                      Palavras chave: Viver bem, viver moral, ética.

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INTRODUÇÃO


            Alguma vez você já se sentiu mal por ter gastado muito dinheiro comprando alguma espécie de futilidade? Alguma vez você já colocou em duvida a realização de algum sonho em detrimento as necessidades básicas de algum desconhecido? Será que para satisfazermos nossas vontades pessoais acabamos por agir de maneira imoral? Estas são apenas algumas perguntas que movem Nagel neste capítulo. O texto é de certa forma a culminância de tudo que foi dito nos capítulos anteriores, digo isso, pois é aqui que sua “visão a partir de lugar nenhum” poderá entrar ao nível de nossos problemas do dia-a-dia.
              


 1. A QUESTÃO DE WILLIAMS

            Uma variedade de elementos motivacionais entre as fontes da moral reflete num sistema de divisão do Eu. Não basta aceitar este fato para resolver essas divisões. Ainda não há base para uma moral substantiva. A discussão sobre a moral ocupou-se dos fundamentos e dos contrastes entre direitos e interesses que os outros podem impingir-se a nós. Para o autor as exigências morais têm uma base objetiva, mas isso não significa que são radicalmente impessoais. A objetividade requer que reconheçamos elementos substanciais de valor pessoal no raciocínio prático e moral.
            Em qualquer moral objetiva o elemento impessoal é importante também. Neste capitulo o autor busca investigar a tensão resultante dos pontos de vista objetivos e subjetivos, afinal, as exigências morais impessoais são dirigidas a indivíduos que tem suas próprias vidas para levar.
            O problema resultante desta tensão não é puramente de teoria filosófica, é também um problema da vida real, isso é, pode ser testado pela experiência, independente de uma moral impessoal. O autor cita que as pessoas de países desenvolvidos gastam com almoços, roupas de marca e outras futilidades muito mais do que a renda familiar anual de alguns países subdesenvolvidos (Nagel, p. 316). Isto parece absurdo quando colocamos como questão “o problema da fome no mundo” e evidencia que uma moral fortemente impessoal com requisitos de significativos de imparcialidade, pode representar uma séria ameaça ao tipo de vida pessoal que muitos de nós consideramos desejável.
               Além das morais puramente impessoais, este problema também se aplica as morais utilitaristas e consequencialista. Sempre que uma moral buscar fundamentos em razões neutras e sólidas enfrentará este problema. O autor deixa a questão do “grau requerido de imparcialidade em aberto” (Nagel, p. 317). Por mais que meus valores pessoais possam não rivalizar com os valores pessoais de outros indivíduos, acabarão por rivalizar com os valores de uma moral impessoal. Posso não me preocupar com o fato de minha refeição custar o mesmo que outra pessoa necessite para comprar uma televisão nova ou aparelho de celular mais sofisticado, mas não posso estar indiferente ao fato que este mesmo dinheiro poderia acabar com a fome de alguém ou de salva-la de uma doença letal.  Com isso, esta questão nos leva a uma “culpa potencial”.
            Segundo Mill (apud. Nagel), são poucas as pessoas que são “bem feitores públicos” na maior parte do tempo, geralmente a maioria das pessoas se ocupam a atender apenas a utilidade privada e de algumas poucas pessoas que fazem parte de suas vidas (Nagel, p. 317). Embora eu julgue que esta visão de Mill é fatídica, ela não pode servir como consolo ou justificativa moral, ou seja, a visão de Nagel se aproxima da visão de Susan Wolf(Nagel, p. 318).
            Williams contesta as “demandas da moral impessoal a partir do ponto de vista do agente individual ao qual se dirigem essas demandas.” Suas objeções se lançam não somente as visões utilitaristas e consequencialista como também sobre as morais kantianas. Nagel julga que nem sempre é claro se o argumento de Willians diz respeito ao conteúdo da moral ou a sua autoridade, mas sua intenção é examinar estas duas perspectivas.
            O problema vai muito além do fato de que em uma moral impessoal muitas vezes nos joga conta nos mesmos e nos leva a fazer coisas contrarias a nossa vontade. Este tipo moral “requer de nós não apenas certas formas de conduta, mas também os motivos necessários para produzir essa conduta” (Nagel, p. 319). “Se é necessário que façamos certas coisas, então é necessário que sejamos os tipos de pessoas que as farão”. Segundo Williams isso requer um conjunto de motivos e prioridades que entre si conflitam-se, acabando por entrar em incompatibilidade com outros motivos necessários para levar uma boa vida. Williams julga que as morais individuais acabam por afastar os indivíduos de muitos de seus projetos pessoais (ficar rico, ter uma casa na praia, comprar um Ferrari, ter um Ipad, etc) e que “O custo de afastar-nos de nossos projetos e de nossa vida é alto demais” (Nagel, p.319).                                   
            Thomas Nagel usa as expressões “boa vida e vida boa” mesmo sendo que Willans use a expressão “viver bem”. Isso porque, Nagel julga que “viver bem” realmente é uma expressão bem alinhada com o pensamento de Willians, mas como o que lhe interessa é a oposição que se dá entre as exigências da moral impessoal e a perspectiva pessoal do agente ao qual elas se dirigem, optou pela expressão “boa vida”.
            Dificilmente um utilitarista vai se abalar com o argumento de Willans. Em primeiro lugar porque julga que seu sistema é perfeitamente capaz de levar em conta os projetos individuais e compromissos pessoais frente o que é bom para os outros e para a totalidade dos indivíduos. Em segundo lugar o utilitarismo não coloca nenhum obstáculo à integridade da vida de ninguém, desde que não escolham projetos que entrem em conflito com o bem-estar geral. Em terceiro lugar o utilitarismo é uma teoria sobre a maneira correta de viver e não pode ser refutado com base em afirmações independentes acerca de como viver bem.
            Os que são adeptos de uma moral kantiana certamente concordarão com esta terceira réplica utilitarista, mas a adaptariam a sua moral. Nesta adaptação a réplica poderá assumir duas formas. Se não admitir o conflito entre viver moral e vida boa, nos dirá que a moral é o que nos dizer o que devemos fazer, acabando por revelar aspectos essenciais da boa vida, isto porque um kantiano que segue esta linha de raciocínio não acredita que não pode haver vida boa que não seja vida moral, assim sendo, não fazendo o que a moral diz que devemos fazer, é “ipso facto” viver mal. Mesmo que o viver moral nos leve a sacrifícios, seria pior ainda não segui-lo. Nesta visão a melhor vida é a vida moral e sendo assim não há conflito entre viver bem e viver moral.
            Por outro lado, se o Kantiano admitir o confronto entre a boa vida e a vida moral, isso significa que ele admite que vida boa e vida moral não sejam as mesmas coisas. Porém irá afirmar que uma teoria moral é a que trata da maneira correta de viver, não da maneira boa, assim sendo não pode ser refutada pelo confronto entre viver bem e viver moral. Ao afirmar isso, fica presumido, falsamente para Nagel, que a moral nos diz como viver da melhor maneira que pudermos, mas ao fazer isso acaba por “considerar os interesses pessoais do agente somente como um fator entre os outros”.
            Para explorar melhor esta controvérsia, Nagel considera que no geral as pessoas conseguem fazer uma distinção rudimentar entre viver bem e viver moral, e que viver moral significa levar uma vida extremamente comprometida com os requisitos morais (Nagel, p.321).
A compreensão deste confronto pode estar aberta a várias posições diferentes que podem rivalizar entre si. Basicamente isso ocorre devido à maneira de se encarar e responder três perguntas chaves:
            1) Em que medida são logicamente independentes as ideias de boa vida e vida moral?
            2) Se não são independentes, qual delas tem prioridade em determinar o conteúdo da outra?
            3) Na medida em que sejam independentes, qual delas tem prioridade em determinar o que é uma vida razoavelmente racional. Qual se deve sacrificar em busca de uma vida racional? Vida boa ou vida moral?
            Nagel está buscando em especial entender a suposição de como uma determinada teoria moral poderá dizer para as pessoas como levarem um vida moral que ao mesmo tempo não seja uma vida ruim. E que com isso está aberto um espaço para a crítica da vida moral, pois a pessoa necessita de “algo a mais” do que a moral para ter uma vida boa.


 2. ANTECEDENTES

            O problema da rebeldia individual frente às demandas da moral impessoal é um velho conhecido da filosofia. Ao longo da história vários filósofos, de várias correntes de filosofia moral diferentes tentaram harmonizar, da sua maneira, este confronto. Julgo até que a as discussões morais e éticas só existem com este fim.
            A República de Platão tenta mostrar que a virtude moral constitui parte indispensável do bem de cada pessoa.
            Para Kant tal harmonia não pode ser experimentada, mas deve ser postulada. Assim, mesmo que talvez não nesta vida corpórea, podemos esperar que o bem mais elevado se realize e a felicidade tenha perfeita correlação com o mérito de ser feliz, pelo menos na vida eterna da alma.
            Nietzsche rejeita a moral impessoal em detrimento a ao viver bem individual. Claro que em Nietzsche o ideal de viver bem tem um sentido muito mais amplo do que apenas realizar as próprias vontades. (Nagel, p.323)
            Bentham aparece como um defensor da moral impessoal, ele nega qualquer conexão entre o que é correto um indivíduo fazer e o que é bom para ele. Para Bentham cada pessoa está interessada em apenas buscar seu próprio prazer e evitar sua dor, sendo a única maneira de fazê-las agir de acordo com o princípio de utilidade é fazer com o que lhe traz felicidade sirva também ao bem-estar geral. Assim sendo tratasse de uma questão contingente.
            Provavelmente a maioria dos utilitaristas contemporâneos não concordaria inteiramente com Bentham. Provavelmente diriam que o princípio de utilidade não diz apenas o que é certo fazer, mas também o porquê temos razões decisivas para fazer. Por que fazer? Simplesmente porque é correto fazer, mesmo que entre em conflito com a felicidade de cada indivíduo. Também teria que ser analisado se eles aceitam ou rejeitam a demanda de conciliação. Por exemplo, Sidgwick duvidava da possibilidade desta harmonia e devido a isso, a moral ficava em uma posição duvidosa.
            Para os kantianos contemporâneos a questão é se na falta de esperança da vida eterna da alma ainda conseguiriam sustentar sua posição frente o problema de Willams. Tanto utilitaristas quanto kantianos se quisessem defender a ideia de conciliação entre a moral impessoal e a boa vida, teriam provavelmente de recorrer ao bem de um eu superior que se expressa por meio da moral impessoal. Para Nagel essa é também a forma geral da solução oferecida por Platão (Nagel, p.324).
            A ideia geral seria que o reconhecimento das demandas morais impessoais carregam valores universais tão importantes que eclipsam outros bens e males que podem nos ocorrer. Independente da visão que se possa ter, geralmente se admite que existam outros bens e males além da vida moral. Devido a diversos motivos duas pessoas igualmente morais podem não gozar do mesmo bem (ele da o ex. onde uma delas tem artrite), mas segundo a visão conciliacionista estes valores jamais poderão fazer com que uma vida imoral seja melhor que um vida moral (Nagel, p.325). Mesmo que a demanda moral possa levar o indivíduo a uma morte prematura, ainda sim seria melhor uma vida moral curta que uma longa vida imoral.
            Nagel suspeita que não seja possível esta conciliação e que ela não é necessária para defender a moral. A moral não desmorona se o bem superior não poder ser atingido. Ele concorda com Willams em que uma teoria moral deve dizer não somente o que moralmente devemos fazer, mas também como levar uma boa vida, mas não crê que se possa rejeitar uma teoria moral com base na alagação que de que quem segue as demandas de uma moral impessoal pode, sobre certos aspectos, ter uma vida pior do que quem não segue estas demandas. Isto porque provavelmente Willams aparentemente coloca mais peso ético no viver bem, enquanto Nagel no fazer o que é correto. É importante salientar que estes dois aspectos parecem ser muito significativos para qualquer teoria moral e que provavelmente não se possa eliminar o confronto entre eles. Assim sendo, outro aspecto que surge como crucial para uma teoria moral é o modo de como ela “resolve” este conflito.


 3. CINCO ALTERNATIVAS

    


            Para dar um enfoque mais sistemático à questão, Nagel apresenta neste capítulo cinco alternativas para questão referente ao viver bem e o viver moral;
            (1) A vida moral é definida em termos da boa vida: É mais ou menos a visão de Aristóteles. Não significa que as duas idéias sejam equivalentes, mas que o conteúdo da moral se define em termos das condições necessárias para uma boa vida, pois esta depende de certos aspectos da conduta do individuo, como o bom desempenho de seu papel social e o controle de suas emoções. Para Nagel (1) está errada, pois os requisitos morais tem sua origem nas demandas das outras pessoas. A força moral não pode se limitar a ajustar-se a boa vida de cada individuo.
            (2) A boa vida é definida em termos da vida moral: É a posição de Platão. Admite que possa haver mais coisas além da vida moral para que se possa ter vida boa, mas a prioridade absoluta é da moral. Assim sendo, uma vida moral pode ser ruim, mas sempre será melhor que uma vida imoral. Para Nagel (2) está errada, pois existem muito mais coisas além da moral que nos dizem o que é bom ou mau para nós.
            (3) A boa vida prevalece sobre a vida moral: É a posição de Nietzsche, também do personagem Trasímaco e atualmente de Philippa Foot. Pode admitir que a moral seja um bem humano, mas ela não pode tomar uma forma dominante. Nesta visão, seria um erro levar uma vida moral se ela não desse ao individuo uma vida boa. Claro que quem opta por essa alternativa, muitas vezes acaba por dizer que a moral em si mesma é um mal para quem a possui.
            (4) A Vida moral prevalece sobre a boa vida: é a posição natural do utilitarismo e das teorias deontológicas não-religiosas, como as teorias do direito. Aqui a moral não entra necessariamente em confronto com a vida boa, mas quando isso acontece, ela nos dará razões suficientes para sacrificar nosso bem pessoal individual. O que se exige moralmente de cada individuo é definido em termos do que é ótimo para a totalidade dos indivíduos. Quem segue esta alternativa afirma que o individuo deve sacrificar sua renda, suas relações, todo seu bem estar se isso for mais útil para a sociedade. Se o individuo tiver sorte, seu bem estar será o bem estar geral e ele levará um boa vida, caso contrário, a moral irá lhe exigir que renuncie uma boa vida.
            (5) Nem a boa vida nem a vida moral prevalecem sempre uma sobre a outra:  Como em (3) e (4), se presume que não se podem definir os dois tipos de vida em termos um do outro e que cada um deles encontra apoio em razões que podem variar quanto à força relativa. Teorias que apresentam a moral como sistema de práticas, regras ou convenções sociais também satisfazem as condições desta alternativa.
            Para Nagel o que é correto é parte do viver bem, mas não é a totalidade, nem a parte dominante. O ponto de vista das demandas individuais é apenas um ponto dentre tantos outros. Ele crê que mesmo que em determinado momento o agir moral possa prejudicar o viver bem, é provável que isso gere diversos outros fatores que em outro momento se agregarão ao viver bem. (Nagel, p.330)
            Willams estaria se afastando da verdade ao afirmar que a moral individual afasta o individuo de seus projetos pessoais. Provável mente ele afirma isso pois acha que individuo se coloca em papel de espectador ao aceitar uma moral impessoal. Fato que Nagel não concorda. Para o filosofo essa alienação deve ser evitada mediante harmonização dos projetos individuais com os impessoais. Isso seria possível porque as morais impessoais não se dão “de fora pra dentro”, pelo contrário, elas refletem nossa própria disposição de vermos a nós mesmos. Claro que nossa vida não está resumida a esta visão impessoal.
            Devido a isso, não se pode pensar que sempre que houver o confronto entre os tipos de vida deva-se sempre dar razões ao viver moral como em (4). Também não se devem dar razões sempre ao viver bem, como em (3). Na maior partes das vezes se deve optar por pela moral, mas a natureza de cada caso deve ser estudada racionalmente. Isso coloca Nagel entes as alternativas (4) e (5).
            Ele está buscando saber se as condições para (5) podem ser satisfeitas por morais impessoais com pretensões universais como o utilitarismo. Por suas convicções morais, ele não consegue concordar com (5). Está fortemente inclinado a pensar que o viver moral sempre tem suas razões para se colocar acima da vida boa individual. Por fim o filosofo acredita que o caminho que a ética deve buscar para essa conciliação não deve ser fácil e nem se pode esperar por facilidade. Assim sendo este problema não pode, nem deve ser superado com o simples recurso de definir o moral como racional ou o racional como moral.

4. O MORAL, O RACIONAL E O SUPERROGATÓRIO

            “Racional” pode significam racionalmente requerido (sentido forte) ou racionalmente aceitável (sentido fraco).
            (4) só é verdadeira se alguém diz que a moral precisa ser racional, o que é diferente para Nagel em relação a dizer que ser imoral é sempre irracional, ou ainda num sentido ainda mais fraco “ser moral nunca é irracional”.
            Destas várias visões há três conclusões possíveis:
            (a) As razões contrárias são decisivas a ponto de tornar o ato irracional;
            (b) As razões favoráveis são decisivas a ponto de requerer racionalmente o ato;
            (c) Há suficientes números de razões contrárias e favoráveis, para que, ainda que o ato não seja racionalmente requerido, seja racionalmente aceitável .
            Para Nagel a moral deve ser racional pelo menos no sentido fraco, mas ele busca uma moral racional no sentido forte.
            Uma ou mais destas conclusões pode encontrar apoio numa teoria ética, sem circularidade evidente e o resultado será a modificação das demandas impessoais. Modificações estas que vão reduzir a dimensão do conflito entre vida moral e vida boa, mas não eliminá-lo. Também diminuirá o hiato entre o moralmente requerido e o racionalmente requerido.
            O fato é que os requisitos morais válidos precisam levar em conta as capacidades motivacionais dos indivíduos aos quais se aplicam.
            Para Nagel a moral impessoal se desenvolve em etapas, originando-se do desejo de “enquadrar” nossas ações e justificações num ponto de vista externo ao nosso. (Nagel p.334 e 335) Este ponto de vista não deve ser de outro indivíduo em particular, deve ser um ponto de vista universal.
            Pode parecer estranho, mas nesta perspectiva devo levar em consideração e tratar da mesma forma um estranho a um familiar. Isto basicamente desconsideram a esfera afetiva onde também há relações de moralidade, mas o fato é que para o filósofo, o indivíduo deve reconhecer que objetivamente não sou mais importante do que ninguém. Está é a parte central de seu argumento e para mim, é justamente onde deve começar a encontrar problemas.
            Seguindo seu pensamento este conflito moral avança para o nível da ética, e deve ser resolvido a partir do ponto de vista que consiga dar uma visão externa para cada caso.
            Nagel não exclui princípios que exijam extremo sacrifícios pessoais, desde de que estes possam trazerem extremos benefícios para a vida dos outros. Refletindo desta maneira, teríamos mudanças nas demandas das morais impessoais, seria uma moral impessoal baseada na tolerância e no reconhecimento de limites. Vejam que isso não exclui o confronto entre moral impessoal e as demandas particulares.
            Nem sempre meus interesses particulares irão fazer com que me rebele frente à moral impessoal, muitas vezes meus interesses estarão apoiados no ponto de vista objetivo. Para pensarmos no ponto de vista objetivo, devemos pensar em como as pessoas deveriam viver, mais do que isso devemos levar em conta suas complexidades motivacionais. “O resultado será provavelmente que em algum limiar difícil de definir, concluiremos que não é razoável esperar que as pessoas em geral sacrifiquem a si mesmas e sacrifiquem aqueles com quem têm estreitos laços pessoais em favor do bem geral.” (Nagel, p.336) Esta seria uma condição de Razoabilidade.
            Aparentemente com isso estaríamos admitindo nosso egoísmo e maldade frente aos problemas dos outros, Nagel não concorda com isso, afinal somos seres complexos, o impessoal é apenas um aspecto de nosso natureza, não podemos ser julgados como piores apenas por as vezes agirmos em benefício próprio.
            Mais uma vez, uma teoria moral deve sempre levar em conta os seres aos quais se destina, suas vocações, vontades, etc. Uma moral deve refletir o que é razoável pedir-lhes e o que impessoavelmente se espera. É necessário um acordo entre o eu superior e o eu inferior para chegar a uma moral aceitável.(Nagel, p.337) Com isso se reduz o hiato e essa sanção impessoal se pode alcançar certo equilíbrio entre as razões pessoais e impessoais.
            Para Wolf “uma perspectiva que não esteja atrelada a um compromisso com algum sistema de valores bem ordenados”, a moral não pode arbitrar sua própria causa. Nagel descorda, para ele o ponto de vista moral deve tentar reconhecer e explicar seus próprios limites.
            O argumento de Nagel aparentemente consegue evitar a circularidade entre moral e racional, pois ajusta os requisitos morais a termos razoavelmente adequados para os seres racionais aos quais se destinam. Ao reduzir as exigências morais, seu argumento também apresenta tolerância e realismo acerca da natureza humana. Agir de acordo com uma moral desumanamente exigente é agir de forma irracional.
            Claro que um “homem santo” que faz grandes sacrifícios em prol das vontades dos outros não deve ser considerado irracional, pelo contrário, suas atitudes são moralmente louváveis. A virtude superrogatória se manifesta em atos de excepcional sacrifícios em benefício dos outros. Dentro do argumento de Nagel, a virtude superrogatória consiste na adesão às demandas da moral impessoal antes de sua modificação para ajustar-se às limitações normais da natureza humana. (Nagel, p.339) Por sua dificuldade de se tornar motivacionalmente verdadeira na vida de cada indivíduo a moral superrogatória merece seu reconhecimento, mas não pode ser parâmetro para o julgamento daqueles que não a atingem.


 5. POLÍTICA E CONVERSÃO


O filósofo duvida que seja passível encontrarmos a conciliação necessária entre os dois tipos de vida dentro dos limites de uma teoria moral. Este é um problema que devemos enfrentar no dia-a-dia. Para isso nos restariam duas possibilidades:
I- Conversão pessoal.
II- Alternativa política.
A conversão pessoal exigiria um grande sacrifício pessoal do individuo. Este, a partir de sua própria razão, teria que encontrar forças para dar um salto de autotranscendência partindo de seus padrões de boa vida e aterrissando nos padrões de boa vida de uma moral impessoal, harmonizando assim, seu conflito interno entre as demandas morais.
A alternativa política trata-se de uma aplicação política mundial onde o fim último deve ser sempre ordenar o mundo de maneira que todos possam viver uma boa vida sem cometer injustiças para com os outros, onde se possa ficar rico sem que se tenha que estar deixando tantos outros pobres.
Se fosse possível fazer uma escolha, Nagel escolheria a alternativa política (Nagel, p. 344). Isso porque requer uma unificação menos heróica, porém quando olhamos para atual situação ética da política mundial, fica claro que a “revolução moral de Nagel” não passa de um sonho distante. Sonho de um mundo feitos de homens iguais a nós, porém livre para devotar considerável atenção e energia a suas próprias vidas e aos valores que não pudessem ser reconhecidos impessoalmente.

CONCLUSÃO


Deve nos estar claro que os requisitos de uma moral impessoal às vezes podem entrar em conflito com nossas demandas pessoais. Isto não nos leva, de maneira alguma, à rejeição da possibilidade de aceitarmos racionalmente uma moral impessoal. O que o filósofo tenta mostrar é que as exigências de uma moral impessoal devem ser ajustadas para estarem de acordo com a racionalidade e as vocações pessoais dos indivíduos que se submeteram a ela.
O problema do confronto entre o viver bem e o viver moral vem sendo negligenciados há séculos pelos filósofos, Nagel se diz profunda mente insatisfeito com isso (Nagel, p.314) e julga que esta deve ser uma questão central para a ética. Ele não acredita que uma vida totalmente imoral possa ser melhor do que uma vida moral, ou que uma vida moral possa ser completamente ruim, porém a racionalidade é o que deve estar pro traz de toda teoria moral, de maneira que mais do que dizer o que é certo fazer, possa dar razões suficientes para dar espaços aos indivíduos ao qual se destina, possibilitando-lhes viver uma vida que seja boa.
Nagel não rejeita o utilitarismo, mas também não se adapta a ele, primeiramente porque considera uma teoria moral demasiadamente exigente, exatamente por isso é incapaz de resolver seu problema central.
Por fim o filósofo chega a falar na necessidade de uma grande mobilização política que seja capaz de reduzir a distância entre os modos de vida citados, porém não dá nenhuma pista de como isso possa ser feito levando em conta nossa realidade.
Julgo que as ideias aqui argumentadas por Nagel são mais do que interessantes e devem ser levadas em conta dentro de qualquer teoria moral ou ética. O único problema que penso ficaria no nível de como aplicar e de suas conseqüências práticas oriundas de sua aceitação teórica. Não basta apenas apontar para uma alternativa política sonhadora de um mundo melhor. Ele chega a falar mais de uma vez nesse capítulo que “eu não sou mais importante que ninguém” tentando fortalecer os princípios objetivos na moral. Porém julgo que ao aceitarmos o pressuposto “eu não sou mais importante que ninguém” estou aceitando também que “ninguém e mais importante do que eu” o que acabaria por empatar o novamente o jogo ente viver bem e viver moral.
crianças se abraçando abraço amizade

REFERÊNCIAS




NAGEL, Thomas. Visão a partir de lugar nenhum. São Paulo: Martins Fontes, 2004 405p.