paradoxal. Isso porque de um lado a “investigação” tem suas raízes em
fundamentos inquestionavelmente sociais, tais como a linguagem, a filosofia, a
cultura a ciência, etc. E do outro lado, a “comunidade” dificilmente tem sua raízes ou
fundamentos ligados à investigação.
Uma comunidade geralmente está enraizada às suas tradições e o que a
mantém unida é a prática. Esta “prática” dificilmente é a prática da autocrítica ou é
questionadora. Visto que para Lipman toda investigação é uma prática de
autocrítica, totalmente exploratória e questionadora; toda investigação está
fundamentada na comunidade, mas geralmente a comunidade não está
fundamentada na investigação.26(LIPMAN, 1995, P. 331)
O conceito de “diálogo” em Martin Buber nos diz que em um diálogo cada um
dos participantes realmente tem em mente o outro(s), o considerando enquanto ser
único e pensante, onde todos envolvidos se voltam uns aos outros com a intenção
de estabelecer uma relação mutuamente estimulante para todos os
lados.27(LIPMAN, 1995, p. 341) Assim sendo, quando for usado o conceito ‘diálogo’
e o contexto for uma Comunidade de Investigação, deve-se pensar em algo muito
diferente e mais complexo do que um mero debate onde cada pessoa trata a outra
como uma posição e não um indivíduo, ou que um bate-papo informal.
O conceito de Buber é muito útil para ajudar na investigação da distinção
entre aquilo que é uma Comunidade de Investigação e aquilo que apenas se diz ser.
Mas é evidente que apenas este conceito não é suficiente para esgotar o total
sentido de ‘dialogo’ em Comunidade de Investigação.
As Comunidades de Investigação caracterizam-se pelo diálogo disciplinado
pela lógica, isto significa dizer que seus participantes devem raciocinar a fim de
acompanhar tudo o que esta ocorrendo em seu interior. Uma vez lançado um
argumento, a investigação deve seguir a sua trilha e sempre que chegar a uma
conclusão sobre alguma inferência, esta conclusão nunca pode ser encarada como
um ponto de chegada, mais sim como um ponto de partida. Um ponto de partida
para uma nova investigação acerca dos pressupostos e fundamentos não ditos na
inferência investigada, ou em outras palavras, uma busca por tudo aquilo que foi
desprezado ou ignorado durante o caminho trilhado.
No diálogo lógico investigativo da Comunidade de Investigação cada
movimento desencadeia uma sequência de novos movimentos tanto confirmatórios,
quanto contrários às determinações que possam ser apresentadas. É exatamente
através deste movimento de encarar as determinações apresentadas em sala de
aula nunca como verdades absolutas, mas sim como fundamentos para novas
suposições, questionamentos e investigações; que a Comunidades de Investigação
se apresenta como um modelo interessante para tornar a Escola uma instituição
realmente prática em relação à produção de novas tecnologias e conhecimentos.
Mais do que isso, toda aquela estrutura regrada onde, entre outras coisas, o
conhecimento é visto como uma série de informações prontas acerca de fatos que
muitas vezes não possuem nenhuma relação com a vida e os interesses dos alunos,
simplesmente deixa de existir. Diríamos que o ambiente escolar se revela como uma
inesgotável fonte de ‘sempre novo’, aberto a um universo de indeterminações,
questionamentos, perspectivas e descobertas tal como o ambiente familiar se revela
para o bebê nos primeiros quatro anos de vida.
É necessário salientar mais uma vez que em uma Comunidade de
Investigação os conteúdos ditos como necessários para o currículo do Ensino
Fundamental e médio não são abandonados. Diríamos que na natureza
paradigmática da educação padrão eles são encarados de maneira quantitativa e
acumulativa, enquanto no paradigma da prática crítica são encarados de maneira
reflexiva, crítica, lógica e dialógica.
Como foi revelado através de minhas vivências relatadas no primeiro capítulo
deste trabalho, as radiantes e curiosas crianças do início da vida escolar não se
tornam os desestimulados e sem interesses adolescentes do final do Ensino Médio
devido à evolução biológica ou psicológica natural que ocorrem nesta fase da vida.
Também não é devido à natureza da Escola enquanto instituição, afinal durante toda
vida escolar as crianças continuam indo à Escola para aprender. O que torna a
Escola chata e desinteressante é a maneira estruturada com que as coisas
acontecem e com que os conteúdos são abordados. Se aquilo que se busca é umaeducação mais interessante para os alunos, mas saudável28 para a sociedade e
gratificante para os professores, devemos tornar naturais os poucos incentivos que
as crianças e os adolescentes podem encontra para continuarem frequentado a
Escola, ou seja, a possibilidade da ascensão social e o prazer de interagir com os
colegas.
Fica evidente que uma das principais características da Comunidade de
Investigação é que preza e busca sempre o máximo de integração entre os alunos.
Isso pode parecer pouco, mas o fato é que a educação tradicional acaba por
repreender e essa integração e isso leva os alunos a perderem não só o ânimo de ir
a Escola, como a Escola caba por perder a incrível capacidade que as crianças e os
adolescentes naturalmente possuem de serem curiosos e comunicativos. Devido a
isso, o modelo proposto por Lipman é muito promissor quando falamos em
aproveitar a vontade de se socializar natural do ser humano nesta fase da vida.
Quanto à questão da ascensão social, julgo que muitos jovens perdem suas crenças
de que podem mudar a suas vidas para melhor através da Escola não devido à falta
de incentivos de suas respectivas famílias ou pelas obrigações sociais que a vida
possa lhes impor, julgo que o principal motivo pela perda dessa crença ocorre na
própria Escola, que costuma constantemente tirar qualquer esperança que uma
criança pode ter de que seu pensamento é único, importante e que pode contribuir
decisivamente na transformação construtiva de sua realidade social.
Este texto faz parte do trabalho chamado “Crítica a Escola” escrito por mim, Fabio Goulart. Para fazer o Download do trabalho Completo CLIQUE AQUI. Todos os dias será postado um novo texto deste trabalho aqui no site! Boa Leitura!
26 O próprio filósofo se diz ligeiramente surpreso pelo fato de dois conceitos que geralmente não são
encontrados juntos (comunidade e investigação) serem a base de sua “filosofia da educação”
27 Lipman apresenta este conceito, porém ele é melhor abordado pelo próprio Martin Buber. (BUBER,
1979)28 Talvez este termo não tenha ficado muito bem nesta frase, mas faz mais sentido utilizar o termo
‘saudável’ do que usar o termo ‘útil’ neste momento. Isto porque não estou querendo dizer que a
Escola deve ser utilizada tal como uma ferramenta na mão da sociedade. Estou querendo dizer que
os alunos devem sair mais aptos a exercerem seu papel ativo em uma sociedade democrática do que
saem se receberam uma educação conservadora.
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