ensino-aprendizagem no ato de orientar o pensamento dos alunos dentro das
determinadas disciplinas propostas. Por que então a Escola não se focaliza no ensino
do ‘pensar em si’? Talvez não seja possível ensinar a pensar através de um curso
rápido ou de uma disciplina curricular específica, mas certamente é possível que os
alunos aprendam a pensar com a própria cabeça a partir do momento em que são
envolvidos com a investigação conceitual dentro da sala de aula. Isso implica dizer
que se deseja atingir seus objetivos, é muito mais interessante para o educador
buscar ensinar a pensar, do que simplesmente repassar para seus alunos aquilo que
aprendeu de seus mestres.
A fim de se ter crianças que pensem melhor, a Escola deve ensiná-las a
raciocinar. Raciocínio este que Lipman conceitua da seguinte maneira:
“O raciocínio é aquele aspecto do pensamento que pode ser formulado
discursivamente, submetido a critérios de avaliação (pode haver raciocínio
válido e não válido) e ensinado. Ele envolve, por exemplo, a utilização de
inferências bem fundamentadas, apresentação de razões convincentes, a
revelação de suposições latentes, a determinação de classificações e
definições defensáveis e a organização de explicações, descrições e
argumentos coerentes. Em geral, ele produz uma sensibilidade em relação
aos aspectos lógicos do discurso que não são desenvolvidos em nosso
sistema atual educativo” (LIPMAN, 1995, p. 46-47)
Ainda muito pequena, quando possui suas vivências limitadas ao ambiente
familiar, a criança aprende a falar suas primeiras palavras. Em pouco tempo ela
percebe que não basta apenas pronunciar sons como “papai” ou “mamãe” para
impor suas vontades socialmente. A criança percebe que está participando de um
grande jogo de linguagem29, onde é necessário seguir várias regras para se ter
sucesso. Com isso, o até então bebê desenvolve seu raciocínio e começa a narrar,
explicar, julgar, desenvolver a lógica e a sintaxe entre as palavras que expele de sua
boca.
Para Lipman as habilidades de desenvolver lógica e sintaxe para sua
linguagem são as bases da racionalidade humana. (LIPMAN, 1995, p. 47) Caso a
criança apresente alguma deficiência no desenvolvimento destas habilidades,
provavelmente apresentará alguma dificuldade de desenvolver as novas habilidades
que a vida escolar pode exigir.30 Da mesma forma, pode ser que a dificuldade de
uma turma em aprender e resolver problemas de álgebra não esteja diretamente
ligada as questões da matemática em si, mas sim à uma deficiência na
aprendizagem da lógica formal que as letras e os números representam. 31
Sob esta perspectiva, não podemos determinar até que ponto a vivência
escolar, tal como foi relatada no primeiro capítulo, estimula e até que ponto retarda o
desenvolvimento da habilidade de raciocinar dos alunos. Por este motivo se deve
estar ciente que a maioria dos jovens que são formados no Ensino Médio possui
basicamente a mesma, ou até um pouco menos, habilidade de raciocínio que
possuíam já na metade do Ensino Fundamental. Por que então “obrigar” os
adolescentes há ficarem tanto tempo a mais frequentando a Escola? Julgo que esta
resposta ainda não deva ser respondida. Primeiramente porque qualquer resposta
do tipo “para aprenderem uma série de conteúdos vitais para a vida em sociedade” é
inválida. Ninguém necessita saber o que é um adjunto adnominal ou saber
exatamente a aplicação da formula de Baskara (x=(-b± √(b²-4ac)÷2a) para viver bem
em qualquer lugar do mundo. Além do mais, mesmo em um país subdesenvolvido e
desigual como o Brasil, a maioria dos jovens possuem acesso a algum meio de
comunicação que consegue transmitir uma quantidade de informações muito maior e
mais interessante que a Escola. Cada novo avanço de interatividade e
compartilhamento de informações por meio digital que a internet proporciona é um
novo contra argumento irrefutável para aqueles que ainda acreditam que a Escola
deve se concentrar em despejar conteúdos objetivos para os alunos. Julgo que se
deve acrescentar ao pressuposto universal de que as crianças vão à Escola para
aprender o fato que devem ir à Escola para aprender a pensar com as próprias
cabeças, para só então depois podermos responder o porquê manter as crianças
tanto tempo na Escola. Caso contrário, a Escola se apresentará como uma
instituição ultrapassada e arcaica, um verdadeiro moedor de crianças do clipe da música
Another Brick in the Wall.
Another Brick in the Wall.
Este texto faz parte do trabalho chamado “Crítica a Escola” escrito por mim, Fabio Goulart. Para fazer o Download do trabalho Completo CLIQUE AQUI. Todos os dias será postado um novo texto deste trabalho aqui no site! Boa Leitura!
29 Wittgenstein chama os segmentos heterogêneos da linguagem, como regras e finalidades próprias
de Jogo de Linguagem (WITTGENSTEIN, 1999). Através da linguagem podemos transmitir cultura,
dar ordens, contar piadas, etc. Mas o mais interessante disso tudo é o fato de que muitas vezes
fazemos isso utilizando as mesmas palavras. Por isso o filósofo percebe que o significado real de
uma palavra só é estabelecido dentro de um jogo de linguagem específico. Fora de um jogo a palavra
está completamente destituída de significado e se inserida em outro jogo de linguagem,
provavelmente assumirá uma nova significação. Quando colocada dentro do campo prático a
linguagem supera o papel secundário de apenas representar as coisas que existem no mundo e
passa a ter o poder de transcender os objetos, podendo assumir um significado muito além dos
objetos que pode representar. Por isso para o filósofo a linguagem possui uma função muito mais
importante do que apenas representar coisas. (SUMARES, 1994)
30 Nada tão grave não possa ser corrigido caso os professores e orientadores descubram o problema
a tempo e se empenhem em solucioná-lo. O problema é que quase sempre essas deficiências não
são identificadas a tempo.
31 Isso reforça ainda mais a necessidade da elaboração do currículo de forma racional.
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