Autor: Dr.Agemir Bavaresco
Um dos célebres paradoxos da história da filosofia é aquele que conta a história do herói grego Aquiles e da tartaruga. Conta-se que Aquiles, disputando uma corrida com uma tartaruga, resolveu dar a ela uma pequena vantagem, deixando que o bicho partisse alguns centímetros à sua frente. Segundo Zenão, por mais rápido que Aquiles se movesse, ele jamais conseguiria ultrapassar a tartaruga, ou seja, cada vez que Aquiles percorre determinada distância num espaço de tempo, a tartaruga já percorreu uma outra distância. Se Aquiles se movimentar mais um tanto para alcançar a tartaruga, terá que se defrontar com o fato de que a tartaruga já terá percorrido mais um tanto, por menor que seja. Esse fato se repetirá indefinidamente. Por mais que Aquiles corra, sempre haverá um espaço a separá-lo da tartaruga. A conclusão de Zenão contraria o senso comum, que aponta para uma vitória evidente de Aquiles. Aquiles nunca pode alcançar a tartaruga; porque na altura em que atinge o ponto donde a tartaruga partiu, ela ter-se-á deslocado para outro ponto; na altura em que alcança esse segundo ponto, ela ter-se-á deslocado de novo; e assim sucessivamente, ao infinito. O que ele queria era demonstrar que o movimento dos objetos é um fenômeno contraditório, em que o sujeito não consegue aprende-los em seu movimento.Com este paradoxo, afirma Žižek, Zenão quer refutar a hipótese do movimento e da existência do Múltiplo e demonstrar a existência do Um e do Ser imutável. Como não reconhecer, nessa relação paradoxal do sujeito com o objeto, nosso desejo de apreender incessantemente o objeto sem poder apreende-lo? Afirma Lacan, o objeto é inacessível, não porque Aquiles não possa ultrapassar a tartaruga, mas porque não pode unir-se a ela. Uma leitura desse paradoxo de Zenão pode ser a do objeto do desejo que nos escapa face à nossa aproximação. Este é o movimento incessante do desejo. Sempre aberto a novos desejos e a corrida do ser humano continua incessantemente no movimento da busca da verdade!
A passagem dialética para a verdade de um objeto implica, portanto, a experiência de sua perda: o objeto, como um dado fixo, dissolve-se na rede das mediações. A “verdade” dialética de um objeto consiste na rede de suas mediações e na perda do objeto. Apreendemos como "verdade" do Ser dos eleatas, a dialética entre a inexistência de movimento e a autodissolução do movimento, perde-se, então, "o Ser" como entidade existente em si. No lugar do Ser, como ponto de apoio fixo, idêntico a si, resta apenas o turbilhão dialético, sem fundo, da autodissolução do movimento (Heráclito), processo tomado, antes, como um objeto externo, ou seja, o Ser imóvel (Parmênides). Então, Heráclito será a "verdade" de Parmênides.
Referência
Cf. ŽIŽEK, Slavoj. O mais sublime dos histéricos: Hegel com Lacan. Jorge Zahar, Rio de Janeiro, 1996, p. 11-29.